domingo, 18 de outubro de 2009

A massa encefálica da massa


“Pane no sistema, alguém me desconfigurou, aonde estão meus olhos de robô?”. A música “Admirável Chip Novo”, da cantora Pitty, aguçou nossa visão acerca da influência da mídia na cultura brasileira. O título dessa música encontra uma paráfrase na composição “Admirável Gado Novo”, da autoria de Zé Ramalho, composta no final dos anos 70, período da Ditadura Militar no Brasil. É interessante observarmos o contexto social e histórico; a inspiração que as gerou: uma releitura do livro "Admirável Mundo Novo", um clássico inglês de Aldous Huxley publicado em 1932; e o conteúdo de ambas, visto que salientam o poder dos meios de comunicação, mesmo em tempos diferentes, e demonstram o alto grau de alienação do povo brasileiro que se submete a uma versão nacional do modelo da política do “pão e circo” romana, distraindo os “que fazem parte dessa massa”, e ditando os padrões de como vestir, comer, falar, e principalmente, o que comprar.


A cultura é um elemento inerente ao homem, e suas diversas formas de expressão são resultado do processo de formação dos indivíduos. A assimilação da cultura nos é convencionada pelo meio em que vivemos, pelas pessoas com as quais convivemos, pelo que assistimos, lemos ou escutamos. É mister que se observe o inconsciente coletivo sendo seduzido e manipulado pela mídia, que altera a existência humana, determinando vários aspectos da nossa vida comportamental, profissional ou comercial.


Quer seja em programas de entretenimento ou em telejornais, o público acaba sendo influenciado por essa poderosa formadora de opiniões, que consegue incutir na mente das pessoas necessidades que elas, de fato, não têm. A persuasão é arma determinante nessa tendência de transformar os produtos da mídia em mercadoria de consumo, onde os meios de comunicação agem como fomentadores de crenças e valores que atendem interesses inteiramente econômicos e políticos.


Há uma espécie de mensagem subliminar nas cenas das novelas, nos produtos mencionados ou mostrados, nas músicas escolhidas, no perfil dos atores, que atrai o interesse do público como se fosse uma verdade absoluta, um padrão a ser seguido. As novelas, por vezes, ditam a moda daquele determinado período em que estão no ar. Notícias podem fazer uma verdadeira reviravolta nos mercados e na política. Sem falar no volume financeiro que o império da mídia catalisa, o que explica a fama de ser considerada o quarto poder.


Ao ser encarada como um produto de mercado, a mídia pode ser consumida e vendida, e essa oferta de produtos “prontos”, dentro do sistema capitalista, nos remete à maquiavélica suposição de que “os fins justificam os meios”. Sendo assim, o alvo não está no público, mas na obtenção de lucro que pode gerar. A sede de poder esvazia o sentido e se resume aos preceitos da valorização e acúmulo de bens materiais.


Há um verdadeiro clima de, como diria Saramago, cegueira coletiva. Onde a sociedade, a massa, perdeu o hábito de pensar, mantendo-se alheia aos “cuidados” da mídia, que dita não só a pauta das nossas conversas, mas também a qualidade do que compramos ou até mesmo nossos padrões de beleza. Essa padronização lança o olhar sobre a sociedade como uma massa uniforme, sendo mais fácil de ser manipulada pelo modelo capitalista.


O poder da mídia na vida das massas é inquestionável. Os veículos de comunicação atingem em larga escala, quase todos os segmentos sociais, tendo em vista os tipos de linguagem e os assuntos que tratam. Com a função de transmitir conhecimento, informação e entretenimento, a mídia representa um espaço de força e poder, e atua diretamente na formação da opinião pública e no desenvolvimento das pessoas.


A cultura do inútil tem alcançado picos elevadíssimos de audiência, em detrimento à valorização da diversidade cultural. O resultado desse circo interativo de consumo instaurado pela mídia é o acúmulo de expectadores passivos, com pensamentos vazios e senso crítico atrofiado, sendo assim, facilmente manipulados pelas ideologias que influenciam os jogos do poder.
O senso comum começa a se libertar, e nesse afã pelo livre-arbítrio, o bom senso encontra em letras de músicas, produto das massas, uma forma de gerar reflexão, dúvida, indignação e uma inquietação quanto ao que nos é imposto. A sensação, ao final dessa análise, é que “o povo foge da ignorância, apesar de viver tão perto dela”. O que fazer então? “Reinstalar o sistema”?!.
Alice Souza

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